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Foto e biografia: https://www.editorapatua.com.br/

 

FLÁVIA LEAL

( Porto Alegre – Brasil )

Flávia Leal nasceu em 1989, em Belém - Pará.

Mora, atualmente, em Porto Alegre. É poeta, escritora e editora, com poemas e contos publicados em antologias. Graduada em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e em História pela Universidade de São Paulo (USP), com período de estudos na Universidade Paris-Sorbonne (Paris IV), e mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

“Vertigem” é o seu primeiro livro de poesia, pela Editora Patuá.

 

ANTOLOGIA PATUÁ 10 ANOS +  Patuscada/ Vários autores.  Editor Eduardo Lacerda.  Capa de  Leonardo Mathias. São       Paulo: Editora Patuá, 2021.;   288 p.   13,5 x 21 cm.   
ISBN 978-65-5864-191-9              Ex. bibl. Salomão Sousa

 

 

fome

o tempo descama a minha pela em lascas
como quem desnuda uma bergamota madura
ele tira pedaço a pedaço da grossa couraça
que se espelha em pó pelo chão da casa
dos restos de pele sorvidos em pó
pela fome do tempo
não se escrevem histórias nem memórias
nem ao menos resiste uma última lembrança
do que um dia foi descoberta
o tempo acha graça da poeira emudecida
que se queria viva
em sua rotina glutônica
cospe as cascas em pó
e mastiga devagar as carnes e as sementes
estamos todos na barriga do tempo
todo dia casca
todo dia pó
todo dia semente
mais um dia amanhece
e ele se prepara para o banquete

 

 

morangos

você cata os morangos do chão
e os leva à boca sem lavá-los antes
mete nos lábios as carnes vermelhas as folhas dos caules
a terra e os restos fósseis
engole todos os vestígios sem pudor sem medo sem culpa
acho que sempre soube que você se tornaria um arqueólogo
Indiana Jones dos tristes trópicos
falta-lhe o chapéu e o medo de cobras
a jaquetinha de couro você já tem
(aquela que a tia Eulália deu no Natal e você nunca mais
tirou do seu corpo franzino nos úmidos invernos gaúchos)
você leva na mochila luvas pincéis espátulas
marshhalltown trowels
sacos ziplock gps pinças
corajoso viajante de desertos e urbes soterradas
descobridor de pequenas grandes coisas que mudam
a compreensão da história
o orgulho semideus da família interiorana
mas ao vê-lo comendo os morangos do sítio
não se sabe ainda onde o arqueólogo se esconde
só se vê o garoto rebelde com o topete James Dean
num frame arranhado de um filme velho
ainda hoje fecho os olhos e não vejo o arqueólogo
somente o garoto que engolia morangos
engolia os morangos e toda a terra
numa única mordida

 

*

VEJA e LEIA outros poetas do PARÁ em nosso Portal:

http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/para/para.html

 

Página publicada em dezembro de 2021


 

 

 
 
 
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